quinta-feira, 27 de março de 2008

.Março 2008 / 1ª etapa.

27 de Março 2008

Depois de uma pequena pausa nas atividades a Batalha do Conhecimento está de volta. O público que curte os embates verbais vai poder assistir os MC´s mais neuróticos do Rio novamente em ação. Pra quem ainda não conhece, vale a pena lembrar o que diferencia a Batalha do Conhecimento das demais batalhas de MC´s. Nas batalhas comuns o foco do “confronto” está na habilidade do MC em improvisar versos rimados, muitas vezes atacando o adversário. Na Batalha do Conhecimento existe um quadro negro onde o público propõe palavras com as quais os MC´s devem rimar. O critério passa pela habilidade do MC em improvisar a partir destes temas (que são renovados a cada fase). “Este modelo vai ser levado pra todos os cantos do mundo. Não é pretensão, é uma missão” alertou MC Marechal, apresentador e mentor da BC.


É justamente esse diferencial que vem atraindo cada vez mais gente pro, rebatizado, Coletivo CIC. O espaço onde acontecem as batalhas funciona nas dependências da Fundição Progresso e, além da Batalha do Conhecimento, abriga oficinas de grafitti (com a rapaziada do Rimas & Tintas) e de audiovisual (com a produtora Favela Filmes). A própria BC voltou ligeiramente reconfigurada. A maior mudança é que ela deixa de acontecer semanalmente, e se concentra somente na última quinta-feira de cada mês. Os finalistas de cada edição receberão uma pontuação que, acumulada, garantirá a vaga do MC na grande final, realizada no final do ano. Outras pequenas alterações aprofundam ainda mais a proposta da Batalha, a tal idéia do conhecimento. A programação começa cedo (17h) com a exibição de um filme, na seqüência acontece um debate com um convidado, e só então começam as batalhas.







O filme escolhido para abrir a temporada 2008 foi The MC (direção Peter Spirer). O documentário apresenta um breve histórico da cultura Hip-hop, mostrando como o MC ganhou lugar de destaque entre os quatro elementos da Cultura. A principal reflexão do filme se baseia na questão: Os atuais MC´s são verdadeiros, ou meros produtos da indústria musical? Para responder essa pergunta o diretor entrevistou gente do quilate de KRS-One, Common, Kanye West, entre outros pesos-pesados da rima. Recomendo o filme, que pode ser encontrado nas locadoras, para quem se interessa em entender um pouco mais como funciona a mente de um MC. Problemas com o horário não permitiram a realização do debate, o novo formato ainda está sendo azeitado, o que não impediu que o público discutisse o filme de maneira informal.



As batalhas começaram por volta das 19:30h. O sistema de sorteio das batalhas (sem hierarquização dos MC´s) permite certas situações curiosas. Logo na primeira rodada aconteceu o enfrentamento entre dois veteranos (Rico X Airá) e dois iniciantes (ODD X Odarayá), a última citada batalhando pela primeira vez. Essa abertura para novos MC´s acaba fazendo da Batalha um espaço de aprendizado. É assim que o MC começa a ter noção de como utilizar o microfone, cantar em cima de bases com tempos e estilos variados e interagir com o público.


Outro aspecto curioso desta edição foi a presença de MC´s de fora do Rio. Pulga (de São Paulo) e, de um pouquinho mais perto, veio Feijão (Nova Friburgo). O amigo não conteve a emoção e, logo que pegou o microfone, soltou: “Viajei três horas pra batalhar 90 segundos, eu sou maluco mesmo!”. Mal sabia que iria conseguir se classificar para a próxima fase, alcançar o total de 180 segundos com o MIC nas mãos.



A tabela da 1° fase ficou assim (o vencedor marcado com negrito):
Airá X Rico
ODD X Odarayá (batalhando pela primeira vez)
Ernesto X Panão
LC X Batoré
Nissin X Grilo (batalhando pela primeira vez)
Feijão X Pulga
Emissário X YCE
Bizarro X Malone

A segunda fase começou com uma batalha de 3 MC´s. Fael, um dos primeiros a comparecer no CIC, havia se inscrito para batalhar. Porém, em algum momento do sorteio, seu nome foi perdido. Em uma rápida decisão da produção (prontamente aceita pelos outros MC´s) Fael foi incluído na famosa Batalha de 2 + 1 e entrou na disputa pelo título da noite. Os destaques da segunda fase ficam por conta de Nissim (aniversariante da noite) com seu flow veloz e idéias apuradas. E André Malone, rimando com sua típica agressividade. A esta altura do campeonato o CIC já estava completamente lotado, de maneira que, o público foi descendo da arquibancada e se aproximando (literalmente) cada vez mais dos MC´s. A distância entre público e MC´s é praticamente nula. O que só ajuda a tornar a Batalha ainda mais quente!

A tabela da 2° fase ficou assim (o vencedor marcado com negrito):
Airá X ODD X Fael
Panão X LC
Nissin X Feijão
YCE X Malone



Da semi-final em diante os MC´s deveriam rimar em cima de produções de MR. Break. Essa é mais uma das novidades da BC. Toda edição vai receber um produtor convidado, que, por sua vez, vai oferecer um beat para o vencedor da noite. Esta é mais uma maneira de agregar os elementos da cultura em torno da Batalha, além de dar visibilidade aos vários produtores que, apesar da pouca estrutura, estão por ai soltando bases de classe.
Fael e LC duelaram. Em seguida foi a vez de Nissin e Malone.

A tabela da semi-final ficou assim (o vencedor marcado com negrito):
Fael X LC
Nissim X Malone

A surpresa da final seria o embate entre dois amigos que começaram juntos a caminhar pelo mundo das rimas. O interessante das batalhas entre amigos é que elas tendem a ser menos agressivas e mais inteligentes, com o uso das palavras propostas no quadro. A expectativa era grande, os nervos estavam acirrados, todos prontos para a grande final que já iria acontecer, mas não antes do show de Emicida. O MC paulistano vencedor da Liga dos MC´s 2006 veio até o Rio para promover o lançamento de seu single "Triunfo". O show foi curto e grosso. Emicida, apesar de estar lançando seu primeiro single, é experiente e cativou a platéia do início ao fim de sua apresentação. Os versos de "Triunfo" (já disponível no myspace do cara) foram acompanhados por grande parte do público. Outros sons, ainda não conhecidos, eram escutados com atenção e seguidos nos refrões automaticamente decorados. Pressão total! Ao final do show Emicida me disse que: "essa batalha é uma parada única. Se falar que é mágico eu vou estar diminuindo o bagulho. Eu falo pra todo mundo que os melhores tão aqui".


Depois do show, já com o horário estourado, só restou tempo e emoção pra grande final. LC e Nissim fizeram uma batalha digna de dois companheiros. Jogo limpo, de alto nível e precisão técnica. No final das contas Nissim levou a melhor, finalizando suas rimas rápidas sempre com uma conclusão inteligente. ("Não quero mão pro alto, eu quero é cabeça erguida") Levantou a platéia e faturou a primeira etapa de 2008.

Além dos pontos na tabela, da grana que a platéia depositou no boné e a base produzida pelo MR. Break. Nissin ainda levou pra casa duas camisas, oferecidas pela TUJAVIU e Cachaça Crew. Que belo presente de aniversário, hein meu amigo?


Final:
LC X Nissim

Tabela de pontuação:
Nissim: 15 pontos
LC: 7 pontos
Malone: 3 pontos
Fael: 3 pontos
Airá:1 ponto
ODD:1 ponto
Panão:1 ponto
Feijão:1 ponto
YCE: 1 ponto

Algumas das palavras escritas no quadro:
Dengue, mosca, favela, saúde pública, de volta, PAC, epidemia, rimas e tintas, prostituição infantil, FARC, coletivo, ano do rato, Zagalo, treta, laudo, BOPE, genérico, low rider, panela, verdadeiro, Nigéria, profissão, verdadeiro, solidão, vai vendo.

Matéria escrita ao som de:
Pharoahe Monch (Internal Affairs)
Mundo Livre S/A (Carnaval na Obra)
Moreira da Silva (O último dos Mohycanos)

João Xavi
Fotos: Pedro Gigante